Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: março 2022

23 de mar. de 2022

Dilúvio em terra de bamba? E a gente samba..., por Valéria del Cueto

Dilúvio em terra de bamba? E a gente samba...



Texto e foto de Valéria del Cueto

Quase um mês sem chover no Rio de Janeiro e a previsão para a noite do domingo, 20 de março de 2022, era de temporais. E assim foi na data marcada para os ensaios técnicos no Sambódromo das escolas de samba do Grupo Especial Paraíso do Tuiuti, Vila Isabel e Mangueira, no carnaval extemporâneo da pandemia, na Marquês de Sapucaí. Melhor o atraso aquático do que a ausência...


Depois de não poder participar do primeiro final de semana de ensaios técnicos por força de um compromisso assumido, esperei ansiosa pelo seguinte. Era o reencontro com os amigos e o início da preparação, quem sabe, de um novo roteiro para fotografar os desfiles marcados para depois da Semana Santa, em abril. Lembra que em 2020 os ensaios técnicos não aconteceram? Só a lavagem da Sapucaí, o teste de luz e som com a campeã do ano anterior, no caso, a Mangueira, na véspera do carnaval. A cara do Crivella e do atraso nas obras da pista, pra variar...

Antes do início das apresentações a chuva já lambia a pista dançando nas rajadas da ventania.

Já entrei no espaço do Sambódromo vestindo a capa e, para checar as condições, rumei em direção a torre de transmissão. Não precisei chegar até lá para imaginar o que veria. O vento empurrava as chuvas para o lado e não havia um único espaço seco na estrutura. Fiquei por ali ilhada embaixo das arquibancadas do setor 11, rodeando e conversando com o pessoal dos serviços gerais, sabendo da vida deles. Todos ligados ao mundo do samba, cadastrados e chamados para fazer a limpeza. Por perto guardas civis reunidos num grupo conversavam sobre... passagens da Bíblia!

Assisti o ensaio do Paraíso Tuiuti da torre mesmo e mal instalada, tendo que secar a lente manchada pelos respingos de tempo em tempo. Desci devagar a pista no intervalo e fui em direção a concentração. Não vi quase nada da Vila Isabel, como você (não) verá nos álbuns.

Fui direto à área da montagem do grid da bateria da Mangueira na Presidente Vargas, do lado dos Correios. Como o corpo da escola montou do lado oposto, na direção do lendário Balança Mas Não Cai, não consegui ver os componentes passando, nem visitar a concentração para rever os queridos amigos da comunidade verde e rosa. Só mais tarde, na pista...

Cheguei a tirar a capa de chuva, mas logo que foi dada a ordem de montagem da bateria, depois da reunião do Mestre Wesley e sua diretoria com os ritmistas, achei melhor vesti-la de novo. Não que fosse adiantar muito diante da água que despencou do céu no ensaio.

Saí no meio dos cuiqueiros gravando o desenho da bateria na passagem pelas arquibancadas do Setor 1 bem vazio, já que chovia pesado. Me desencantei quando, depois de seguir até o Setor 3 e retornar para o primeiro recuo com os ritmistas, descobri que a câmera não havia gravado! Das duas uma. Ou desanimava e desconcentrava ou dava o troco nas fotos.

Claro que optei pela segunda hipótese. Foi aí que descobri vasculhando a mochila e fazendo malabarismo enredada nas alças e mangas encharcadas que não estava mais com a “capa de chuva” do equipamento. Dei pela ausência do acessório essencial no primeiro módulo de julgamento e vi como fazia falta porque, por cima de mim, a manga de uma mão com um celular que gravava as apresentações da comissão de frente, pingava insistentemente em cima da Nikon! “Ai meu santo dos circuitos integrados, protegei o equipamento”, rezava no meio da cantoria...


Olhei em volta e a única coisa que achei foi uma bandeirinha da Vila Isabel, que havia acabado de desfilar. Expliquei a situação à senhora que estava na frisa e ela pediu para a neta ceder o plástico. Imaginei na hora se não estava desestimulando a menina, para quem a bandeirinha poderia significar uma lembrança da noite inesquecível.

Agradeci e improvisei um nozinho na parte de baixo da lente. Era o que tinha para o momento. Corri para o segundo módulo de julgadores serpenteando pelo meio das baianas e algumas alas embaixo do temporal. Registrei novamente imagens da comissão de frente e esperei pelo casal de mestre-sala e porta-bandeira, Matheus Olivério e Squel Jorgea.

Nessa altura já não tinha mais panos secos para enxugar o equipamento. Uma toalha pequena e um lenço estavam ensopados. Torcíveis, como a roupa do corpo. O tênis fazia choc choc nas poças da beira da pista. Impossível escoar tanta água, mesmo com o novo sistema recém inaugurado. Nas costas, a mochila por baixo da capa ainda resistia, mas o suor também a deixava úmida por dentro. O mesmo nos braços. Sentia a água escorrendo pelas costas, o capuz jogado para trás, inoperante.


Para acessar o álbum de fotos no acervo carnevalerio.com no Flickr clique na imagem ou aqui

A única preocupação era com a câmera. Lembrei da camiseta que havia trocado pela camisa antiga da bateria da Mangueira, para facilitar o reconhecimento pela harmonia da escola. Foi a salvação. Usei para ir enxugando a lente dos pingos e a câmera, protegida pelo corpo e a capa das rajadas de chuva.

Fiz os registros de Débora de Almeida e Renan Oliveira, o segundo casal, já na terceira cabine de julgadores, embaixo da torre de transmissão e por ali esperei a chegada da bateria comandada por mestre Wesley e a rainha Evelyn Bastos.


Usei a última parte da pista para fazer mais registros do mestre, da rainha e, claro, dos ritmistas que sambavam na dispersão, em frente a Apoteose de Oscar Niemeyer.

O arco se projetava sobre o povo do samba em sua manifestação carnavalesca mais genuína, num ritual mítico de lavagem e purificação das dores que cercaram a vida de todos nós nos últimos dois anos...

PS: As fotos saíram e, tanto a câmera quanto eu nos recuperamos. Ela mergulhada no arroz para secar e eu num banho bem quente pra reequilibrar.

Evoé que tem carnaval pela frente...

Valéria del Cueto é fotógrafa, jornalista e técnica cinematográfica. Da série “É carnaval”  do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

@delcueto.studio na Colab55

Studio na Colab55

9 de mar. de 2022

Sacode a poeira - uma crônica indesejável da série "É carnaval" de Valéria del Cueto






Sacode a poeira!

Texto e foto de Valéria del Cueto

Então... Sabe o minidesfile das escolas de samba, a Abertura Rio Carnaval 2022, na Cidade do Samba, durante o carnaval? Falei nele no último texto publicado. Não fui. Não me pergunte o porquê. Ficaria no vácuo essa resposta. Só posso dizer como. Apesar de ter pedido o credenciamento antes mesmo dele ser aberto, ter renovado a solicitação no prazo determinado e reenviado novamente após apelar a quem de direito, fiquei a ver navios.

E assim estamos até hoje, caro leitor, olhando o mar e tentando decifrar o motivo da recusa.

Vou confessar, a pancada pegou em cheio depois de dois anos de pandemia onde, por convicção e respeito, abri mão de todas as atividades carnavalescas. A Abertura Rio Carnaval seria a volta ao mundo do samba. Os motivos justificavam a largada. Para começar, comemorar o fim do bloqueio que durante a reclusão me impediam de mexer, como gostaria, no acervo carnevalerio.com.

A quebra da barreira do amor (in)contido havia acontecido no ensaio fotográfico com Jhéssyka Santtos, passista da Mangueira. Dias depois, já às portas do carnaval, ela traria ao mundo Jady. Mais uma flor, uma cria verde e rosa. Voltar à quadra vazia rompeu um dique de emoções represadas e, finalmente, estabeleci a meta de cair dentro da Abertura Rio Carnaval que aconteceria em seguida.

Sempre disse que essa história de fazer planos não combina comigo...

A outra razão para definir o evento como meta, pauta e capa do Diário de Cuiabá pós carnaval era, claro, ver como funcionaria o formato de minidesfile proposto pela Liesa.

Bailei na curva e, por isso, estou aqui justificando para você, leitor de tantos carnavais, não trazer imagens nem impressões da festa da Liesa, a largada do novo período do carnaval carioca que acontecerá em abril.

Tentei acompanhar pelas redes sociais, mas não consigo, com as informações fragmentadas, formar ou repassar qualquer opinião.

Também não acho justo quebrar, depois de tantos anos, o compromisso de colocar em suas mãos material exclusivo em texto e imagens, sempre acompanhado daquele alerta de que as impressões narradas eram as minhas e que, portanto, não falaria do que não vi, apenas do que passou diante dos meus olhos. A máxima continua valendo. O que não vi não posso analisar ou avaliar.

Nessa hora, não penso apenas nos leitores de Mato Grosso que acessam os textos e crônicas por meio do jornal e sites parceiros baseados lá e em outros estados.

Vou confessar: queria mesmo era contar o que (não) vi para Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, pelo Tribuna. Afinal, um novo formato mais compacto de desfile poderá ser adaptado à cidade na fronteira gaúcha que já tem uma robusta tradição de carnaval e, no momento, se prepara para um upgrade em suas estruturas turísticas com a vinda de muitos visitantes alavancada pela abertura de freeshops e um novo fluxo de turistas da tríplice fronteira.

Fica para o próximo evento que inclua os minidesfiles. Eles virão, tenho certeza.

Até lá, nada de promessas ou planos. Em abril haverá o desfile das escolas de samba no Sambódromo fechando um mega feriadão que começa na Semana Santa e termina no fim de semana de Tiradentes e São Jorge.

Como nos últimos 14 anos, pedirei credenciamento. Esse, o da Sapucaí, incluindo o colete para fotografar na pista, nunca me foi negado. Mas, pós pandemia, sei lá. Fiquei com trauma, depois do bloqueio.

O que prometo a você, querido leitor, é não deixar de pedir passagem e o acesso dos cronistas carnavalescos ao palco da festa para que haja um registro autoral da folia. Para que se preserve o espaço dos responsáveis pela criação dos desfiles que, por coincidência, aconteceu há 90 anos.

Até lá, firmo o compromisso que está ao meu alcance de voltar à Sapucaí nos ensaios técnicos. Aqueles que definharam, foram suspensos e voltarão, nos próximos finais de semana, com força total!

Tudo se renova... Por que não a fé em um inesquecível, mesmo que tardio, carnaval?

Evoé!

*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Da série “É carnaval”  do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

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