Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: Nem que venda jornal

1 de set. de 2010

Nem que venda jornal

Benhur Bortolotto Edição de 20|08|2010

Tenho visto que em jornalismo qualquer coisa pode virar notícia. Algumas notícias podem vender jornal, e algumas podem causar certo interesse público; o que é um tanto curioso, já que há muito tempo não acontece nada de novo no mundo. Às vezes nos deparamos com feitos que nos impressionam não pela originalidade ou pela real importância que podem ter no desenrolar da história, mas por sua escala. Atentados terroristas já haviam acontecido aos milhares, e os incontáveis mortos dilacerados indiscriminadamente por bombas já eram um exército absurdo de cadáveres estropiados quando as torres do World Trade Center foram abaixo e o exército americano invadiu um Afeganistão de resistentes já mortos e que não poderiam jamais fazer frente aos aparatos de tecnologia insondável de que vinham munidos os seus inimigos. A insensibilidade, a fé e a loucura já haviam promovido inúmeras perseguições quando crianças católicas foram impedidas de entrar em uma escola em Belfast, sendo apedrejadas por protestantes. E os escândalos de corrupção dos políticos atuais não encontram narrador tão elegante quanto aquele padre jesuíta, António Vieira, morto há mais de 300 anos.
Desde que sou editor-executivo deste jornal, apenas duas matérias me causaram interesse. A primeira foi uma feita no brete do Imbaá, a segunda, veiculada na última sexta-feira, sobre um sepultamento realizado às escuras após um festival de inoperância e insensibilidade que fez uma mãe trazer o corpo da filha de Santa Maria até aqui com os pés de fora do caixão, pequeno demais para o corpo da jovenzinha. O medo e o desamparo não são novidade nenhuma, mas contemplá-los com respeito é o mínimo de dignidade que se deve esperar de um ser humano. Os mortos não sentem frio, e a fome, como já se sabe, acostuma. Mas quando se leva a filha ao túmulo com os pés de fora, e quando a fome é a realidade de uma criança que brinca num brete por onde passam valiosíssimas cargas que são a riqueza para as praças, os pisos novos, os prédios desnecessários e todas as outras inaugurações alegóricas de que se tem – e muita, porque, como foi dito, tu pode virar – notícia, não há mais caminho possível. Nem que venda jornal, nem que cause algum interesse público. Mas que vire, sim, notícia e não passe em branco nossa culpa.



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6 comentários:

Anônimo disse...

as frases desse cara são geniais. Ele é o maior prerservador da natureza que existe. Em poucas palavras ele alcança uma profundidade inacreditável. Parabéns, Benhur! Parabéns, Tribuna!

Anônimo disse...

TE acovardastes Fred?

Anônimo disse...

Que menino valente e sensível, este dos cachinhos!

Anônimo disse...

ui,ui,ui!

fredwm disse...

Anônimo das 10:20
Covardia?
deve ser uma ironia -
abs
siga conosco
FWM

Anônimo disse...

Lindo! lindo! Lindo!O teu comentário também...