Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: O chuá no chuê, chuê - por Valéria del Cueto

18 de jul. de 2018

O chuá no chuê, chuê - por Valéria del Cueto

O chuá no chuê, chuê

Texto e foto de Valéria del Cueto

Céu, sal areia, mar. É tudo que se faz necessário para, finalmente, abrir o ciclo do segundo semestre (pós Copa do Mundo da Rússia) já em curso. A registrar, além das surpresas que fazem do futebol um esporte tão vivo quanto a bola do jogo, as cenas inesquecíveis da premiação.

Se tudo estava quase dando certo para a imagem vendida ao mundo pela potência anfitriã, ali, todo esforço semiótico (que incluiu ensinar seus sisudos cidadãos, pelo menos nas cidades sedes, o poder do sorriso), caiu por terra.

Na verdade, a lua de mel havia ido somente até a questão da homofobia legal que impede manifestações LGBTS e afins de qualquer tipo em local público. O limão acabou virando limonada e as camisas das torcidas formando a “bandeira” com as cores do arco-íris foi notícia mundial. Um estepe alegórico que tirou o foco da questão mais séria: o direito usurpado de manifestar sua sexualidade livremente.

O que se esperava? Não, a Rússia não é um país democrático. Portanto, manda quem pode, obedece quem quiser (ainda) ter juízo.

Na cerimônia de encerramento a participação do atabaque do campeão mundial de 2002 Ronaldinho Gaúcho foi, sem dúvida, um toque de mestre para aproximar a nação que convidava de seus exóticos visitantes de todos os quadrantes do mundo. E convenhamos, quando o assunto é sorriso, Ronaldinho bate um bolão.

Tudo acontecia conforme o minunciosamente planejado até que um imprevisto climático serviu para, em minutos, fazer cair a máscara de polidez, respeito e delicadeza do cerimonial do encerramento.

Começa a chover. No palco do gramado os presidentes da Fifa, da anfitriã, da França e da Croácia participam da premiação da inédita vice-campeã e da bicampeã mundial, a seleção francesa. Aos primeiros pingos surge um e-nor-me guarda-chuva. Ele é posicionado para proteger os convidados, entre eles uma dama, a mandatária croata? Não.

O apetrecho impede que apenas e tão somente o poderoso Putin seja protegido do aguaceiro que, em questão de minutos, encharca as autoridades. Os jogadores, recebendo suas medalhas e cumprimentos, cá entre nós, não têm do que reclamar, querem mesmo é festejar a conquista.
As câmeras da transmissão oficial reproduzem as imagens para o mundo e mostram a cena constrangedora por vários minutos. O terno do presidente Emmanuel Macron, da França, já havia até mudado de tom, de tão molhado estava. Assim como a camisa xadrez da seleção croata e os cabelos da presidente Kolinda Grabar-Kitarovic, nada resistiu a chuvarada que desabou sem dó nem piedade celestiais.

Finalmente começam a surgir outros guarda-chuvas. Menores. Eles são distribuídos aos assistentes para que protejam os convidados. Só que... mais uma vez, diante do mundo, as prioridades são invertidas. Primeiro eles. Eis que chega uma proteção para Macron. Depois, os próprios assessores se garantem...

Ali se via como a banda toca: todos protegendo os chefes e se protegendo. Sem ninguém tomar a iniciativa de, num ato de gentileza, oferecer abrigo à única mulher na linha de frente da cerimônia, a presidente da Croácia.

O que há de anormal na cena? Nada. Esta é a ordem mundial, a vida, a sociedade. É o terceiro milênio! Onde (ainda) é preciso matar um leão por dia para se impor. A vitória foi francesa, mas Macron, ao distraidamente esquecer tudo que sua professora e companheira deve ter lhe ensinado em sua convivência sobre como tratar as mulheres, colaborou para agigantar ainda mais o feito da Croácia e de sua presidente.

A que viaja de avião na classe econômica, paga sua passagem com dinheiro do bolso e tem descontados de seu salário os dias que acompanhou, como torcedora nas arquibancadas, a incrível trajetória da seleção de seu país que, como ela, surpreendeu o mundo...
  
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Arpoador”, do SEM FIM...delcueto.wordpress.com

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