8.916.100.448.256 = 12¹²
Texto e foto
de Valéria del
Cueto
Querida cronista. Que desafio virou trazer notícias pelo raio de
luar. O que já foi prazeroso está se transformando num esforço hercúleo com
variantes quase infinitas, como o vírus da Covid-19.
Se o semideus da mitologia grega cumpriu 12 trabalhos, no mundo
contemporâneo eles não seriam multiplicados, mas elevados a sua própria
potência (12¹²). Não
precisa calcular esse número trilhométrico, amiga voluntariamente enclausurada,
basta olhar para a nesga de céu da janela de sua cela e amplificar o número de
estrelas que você enxerga para uma parte considerável da abóbada celeste e...
voilá!
Assustei, né? Essa é a sensação que tenho e não consigo
disfarçar (nem por uma boa causa) como é difícil manter-me fiel as conversa
pelo raio de luar que a conecta com o mundo exterior.
As demandas intergalácticas são tantas! A tarefa de interlocução
e tradução das pouco sutis intervenções humanas no curso dos acontecimentos
dessa galáxia me consomem.
É muito complicado explicar aos seres extraterrestres que
requisitaram minha expertise a velocidade e o rumo dos eventos produzidos pelos
humanos, especialmente os de forma voluntária. Por exemplo: como e por quê
alguém se acha no direito de lotear a Lua e, até, Marte? Quando eles, os
visitantes, voltam seus sentidos para o conjunto da obra planetária as coisas
se complicam mais ainda...
Quanto mais tento explicar que em meio a barbárie travestida de
sofisticação tecnologia há, sim, um fio de esperança e a possibilidade de
avanços da raça humana, mais os fatos me contradizem. É tiro, porrada e bomba para
todos os lados.
Massas de refugiados, povos originários sendo atacados,
dizimados e usurpados, grandes potências se enfrentado por um poder efêmero (como
a história já cansou de comprovar), o número crescente de esfomeados e novas
formas pouco sutis de escravidão. Claro que há, por parte de alguns poucos, um
enorme esforço pelo bem comum. Porém, essa guerra está sendo perdida em várias
frentes, infelizmente.
Cronista, eles não se satisfazem em causar destruição entre sua
própria raça. Estão determinados a dizimarem outras espécies em prol de sua
ganância insaciável. O planeta não está aguentando o impacto de tanta
expropriação de seus recursos naturais.
A natureza reage e contra-ataca mandando alertas desesperados e
mostra, por exemplo, com o vírus que evolui mais rápido que a ciência, quem
dará as ordens no quesito evolutivo.
Não é possível que seres capazes de criar maravilhas partam para
a ignorância de uma forma tão autodestrutiva. Só penso num personagem que você
me apresentou quando, ainda cheio de ingenuidade, desembarquei por aqui. Santos
Dumont, o pioneiro em fazer um objeto mais pesado que o ar voar (outros estavam
chegando junto). Mas o que você me fez observar foi a decepção do inventor
quando viu seu sonho virar uma máquina de guerra destruidora.
É isso que os deuses devem sentir em relação a sua criação, o
ser humano. Por isso eles devem ter desistido da espécie. Os criadores
abandonaram as criaturas. E eu, pobre Pluct Plact, não tenho mais argumentos
para evitar o destino. Essa praga não pode se apossar de outros mundos!
O que me diferencia dos demais visitantes é que, na nossa
osmótica convivência, quando aprendi a chorar também descobri um dos sentidos
de amar, que é o não abandonar.
Por isso, me uno a você no seu silêncio e isolamento, (a forma
mais digna de não se deixar vencer pelos inimigos, os arautos da morte de da
destruição quando perdemos as forças), até que a sorte nos favoreça e,
revigoradas, as energias divinas restaurem a sinergia natural de Gaia: a
esperança no renascimento da vida...
*Essa Fábula Fabulosa é dedicada a Enock Cavalcanti e espero que
responda a sua pergunta “vertical”
**Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de
carnaval. Da série “Fábulas
Fabulosas” do SEM FIM... delcueto.wordpress.com
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