Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: Fé no axé, solidariedade e samba, por Valéria del Cueto

16 de abr. de 2019

Fé no axé, solidariedade e samba, por Valéria del Cueto

Fé no axé, solidariedade e samba


Texto, fotos e vídeos de Valéria del Cueto

Sim, ainda há esperança! Um fio dessa energia (tão em falta por aqui) foi reforçado na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, Cinelândia, coração da cidade, na noite de sexta-feira, 12 de abril de 2019.

Na entrega da Medalha Pedro Ernesto para Evelyn Bastos, a casa do povo recebeu o povo. Preto. Para reconhecer o valor e o trabalho de uma rainha da favela. E da Bateria da Mangueira.





Não, não foi esse honroso título mangueirense que levou a menina das vielas a ser homenageada por uma iniciativa do vereador Leonel Brizola Neto.

Foi o conjunto da obra de uma mulher que, para poder estudar, conseguiu uma bolsa de estudos num colégio em Cascadura e com a ajuda do “Senhor Álvaro”, como ela chama Alvinho, ex-presidente da verde e rosa, que bancou seu transporte e os livros, se formou em Educação Física. Um exemplo a ser seguido.

No samba, é o que é. Uma passista de primeira. Filha de Valéria Bastos, Rainha de Bateria da Mangueira de 1987 a 1989, sempre disse que chegaria lá. Assumiu o posto quando, num resgate as tradições da escola, uma menina da comunidade voltou a desfilar na frente da bateria. Tinha 19 anos.


Em 2015 criou o projeto Samba, Amor e Caridade, o SAC. Alimentos e roupas são recolhidos na quadra, o Palácio do Samba, e distribuídos para os moradores de ruas da cidade. No início eram poucos. Hoje...

Na Mangueira cuida, ensina e incentiva as meninas que sonham em, como ela, serem passistas. A exigência é que estudem, para crescerem na vida.

Juntou a fome com a vontade de comer, no quesito combate a intolerância, ao se inserir de corpo (e que corpo) e alma no enredo “Histórias pra ninar gente grande”, do carnavalesco Leandro Vieira, que deu a Mangueira o campeonato do carnaval 2019. Representou Anastácia no ensaio técnico. No desfile oficial Esmeralda Garcia, escrava considerada a primeira advogada no Piauí.




Evelyn é do bem e “colocada”, como mostrou em seu pronunciamento que, fez questão, fosse da tribuna Marielle Franco. “Para falar do povo preto e favelado”. Estendeu a homenagem acrescentando 100 moções de louvor e reconhecimento a mangueirenses e personalidades.

A cerimônia foi emocionante. A começar pela interpretação de Cacá Nascimento, a capela, do Hino Nacional. Das galerias, a bateria deu o ritmo para o samba enredo campeão de 2019. Totalmente pertinente no contexto da homenagem.



As autoridades presentes e convidados fizeram pronunciamentos intercalados de vídeos. Um deles mostrava um elemento de ligação entre o sonho e a realidade do carnaval carioca. Foi com Leonel Brizola falando o que imaginava para o espaço recém construído do Sambódromo que em 2019 completou 35 anos. A palavra-chave era educação.

Evelyn, muito emocionada, em sua fala “fechou” o círculo. Religiosidade, o orgulho de seu povo preto, afeto, apoio, educação, crescimento e, principalmente, solidariedade. O poder de retribuir e ampliar a rede de proteção de sua “favela”.

Claro que não poderia faltar, para finalizar a homenagem, o giro das baianas e a saudação de representantes de segmentos tradicionais da escola ao som da bateria da Mangueira, comandada por outro “cria”, Mestre Wesley.


Num momento em que o axé da cidade e dos cariocas andam tão abalados pelos últimos acontecimentos, a reunião da comunidade verde e rosa no Palácio Pedro Ernesto, antiga sede do Senado Federal, quando o Rio era a capital da república, foi um foco de resistência amorosa gerando uma sinergia positiva, união e sintonia do bem.


Exemplo e caminho que indicam as forças que precisamos comungar urgentemente para reencontrarmos a capacidade de nos reerguermos e reinventarmos. E como andamos precisando desses elementos catalizadores...


*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “É carnaval”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com

Studio na Colab55

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