Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: 04/24/19

24 de abr. de 2019

Tartarugas no Caminho, por Valéria del Cueto

Tartarugas no Caminho

Texto, vídeos e fotos de Valéria del Cueto

Não sou a única que respira melhor na Ponta. Outro dia tartarugas escolheram, como eu, a Pedra do Leme para relaxar. As águas claras e transparentes serviram de cenário para o bailado das meninas. Cheguei lá pelas duas da tarde e acabei perdendo a hora na marola do sábado.

Não era uma, nem duas. Filmei três e vi outra fora de quadro. Para poder gravar e fotografar tive que me integrar ao ambiente. Havia chegado no final do Leme em busca do melhor lugar que conheço para refletir (sem desmerecer outros sensacionais). O que diferencia, para mim, a Ponta do Leme das outras pontas, como a do Arpoador, é a minha pedra, o monólito vigilante da Praia de Copacabana.

Em vários momentos, abraçar a Pedra do Leme foi a maneira que encontrei de me conectar a natureza e, dela, tirar forças e ensinamentos transmitidos por sinais que me situam nesse universo. É ali, sentindo seu calor que recebo forças vitais pelo ar, a água, a terra e o calor do sol. Tudo interligado com o bloco mineral que se projeta na paisagem.

Não é só lá que dialogo com a natureza. É isso mesmo, eu me aproximo com minhas dúvidas, incertezas e imprecisões e ela me responde em sua essência. Tipo os sinais de fumaça dos índios, vistos a muita distância, contanto que o tempo colabore. Há que estar em sintonia.

Já tinha esse sistema de mensagens inserido no inconsciente. Me lembro, muito garota, de num momento crucial ter ido para a Praia de Copacabana, no posto 6. Era um dia muito feio, mas estava precisando dialogar comigo mesma. Vestia um suéter verde musgo do meu pai. Caso a chuva anunciada despencasse, certamente ele seria não só inútil como, também, viraria um pano de chão, daqueles que absorvem a água e a gente torce no balde.

Pois foi só chegar num banco, perto do que hoje mora Carlos Drummond de Andrade, para que algo acontecesse nos céus. Por incrível que pareça, chovia pra todos os lados, menos no caminho até o Forte Copacabana. Nunca entendi o fenômeno, mas não demorei muito a captar a mensagem. 

Mesmo que o entorno sofresse muitos abalos, o meu equilíbrio se manteria intacto. Sacudido, claro, mas ele suportaria o tranco.

Foi no Pantanal, entre Cáceres e Corumbá, na viagem da Expedição do Sem fim... do Paraguai, que aprendi com o Chicão, um dos piloteiros, a observar outros sinais. Ele me mostrou as estrelinhas sorrindo no imenso céu pantaneiro. A instrução se complementou na Ilha do Brandão, em Angra do Reis. Lá, Dona Maria me explicou como o ronco de setembro podia definir as ressacas de fevereiro. Se a natureza manda recados, por que não usá-los e lê-los, como mensagens mais diretas?

É claro que não vale a gente pensar só na gente. Funciona melhor quando estamos firmando em energias coletivas. Mas, vez em quando, acredito num recado personalizado. Ultimamente ando lendo as nuvens que se formam para as bandas dos Dois Irmãos, ao lado do Vidigal, depois da curva do Leblon, vista de Ipanema.

Foi com esse espírito que dobrei a curva no início da orla de Copacabana, subindo a rampa para alcançar a estátua de Clarice Lispector na linha dos quiosques, contornando a Pedra do Leme. E, ali, parei diante de uma alteração na paisagem...


Pasmem, agora a Comlurb, a do prefeito Marcelo Crivella, está usando o espaço na areia colado no acesso ao Caminho dos Pescadores como “parque” dos maquinários que usa na limpeza da praia. Os equipamentos, além de poluirem o visual, agridem o meio ambiente. São motorizados. Qualquer vazamento cai direto na areia da praia! A Comlurb e uma penca de secretarias municipais devem explicações e, também, tomar providências urgentes para acabar com essa agressão a um dos mais lindos cartões postais do Rio de Janeiro!

Tudo isso para alcançar o paraíso e, nele, encontrar as tartarugas, cardumes de peixinhos e outros exemplares da vida marinha ali, ao alcance de nossos sentidos.

E chego lá, na mensagem prometida. Ela indica que assim como as tartarugas centenárias... nós ficaremos, eles passarão! Qual as lebres de Esopo e La Fontaine nas suas fábulas, podem até te largado na frente, mas estão indo com muita sede ao pote...

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Ponta do Leme”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com

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