Pode ser
Texto e fotos de Valéria del
Cueto
E não
apenas pela mudança previsível do ciclo anual. Depois de um longo e nebuloso
dezembro no primeiro dia do ano parece que mudou a chave e tudo que era cinzento
e molhado se acendeu.
Como cria
carioca fiquei mais tranquila quando vi, no último minuto do segundo tempo,
quase no final da partida que arrastaria o mau tempo noite da virada a dentro,
que a produção do mega espetáculo se rendeu ao charme de uma mandinga sempre
usada em outros episódios que que a chuva estragaria a festa.
Mais uma
vez, foi contratada a Fundação Cacique Cobra Coral para segurar as nuvens,
limpar o horizonte e encerrar a prolongada e detalhada lavagem celestial que se
arrastava há semanas, mudando as tonalidades do cenário da Cidade Maravilhosa. Pedido
devidamente feito, desejo de todos atendido. Foi justamente a ausência total da
mais leve brisa que escondeu parte dos fogos das 10 balsas posicionadas em
Copacabana atrás de uma quase sólida barreira de fumaça.
Atrapalhou?
Um pouco da segunda parte dos 12 minutos do espetáculo. O “defeito” climático
logo foi esquecido pelo astral de Zeca Pagodinho e da escola de samba
Acadêmicos do Grande Rio, com os axés do samba enredo 2023, que homenageia
justamente o querido cantor de Xerém, (distrito de Duque de Caxias, comunidade
da agremiação), e de Exu. O orixá que regerá 2023, junto com Oxum, Iansã e
Iemanjá.
Tirando esse porém, a festa no Palco Copacabana foi de muita alegria. Um astral contagiante, já alcançado no show de Alexandre Pires, a quem coube homenagear o Rei Pelé, antes da meia noite.
A edição
desse ano entra na lista dos réveillons inesquecíveis, parte da história da
cidade e da memória de milhões de visitantes. Os números, como sempre, impressionam.
Perigos? Sim. O que esperar de uma multidão de mais de 2 milhões de pessoas.
Típica situação em que vale a regra três, “onde menos vale mais”, imortalizada
por Vinícius de Moraes e Toquinho.
A melhor
medida para a sintonia que rolou nas míticas areias de Copacabana? O espírito e
a energia que nortearam a festa da virada, inspirados por uma iluminação
caprichada e pelas sensacionais imagens projetadas no fundo do palco emoldurado
pelas luzes da Princesinha do Mar.
Demorei um
dia para voltar ao Rio. Como grande parte dos brasileiros passei o primeiro de
janeiro sintonizada em Brasília na terceira e, acho que mais emocionante, posse
do presidente Lula.
Imagina a
vontade de fazer do fim de tarde do dia 2 de janeiro, uma segundona, um “modelo”
para as mais de 50 aberturas de semana de 2023...
O destino
foi a entrada do Arpoador onde, com milhares (sim eu disse milhares, a praia
estava lo-ta-da) de turistas, lagarteei ao sol de fim de tarde sentada na
mureta aos pés de Tom Jobim.
Não, nada
de mar ou areia que é para deixar Iemanjá complementar o incrível trabalho dos
garis cariocas, tendo tempo de limpar a carga deixada em seus domínios na noite
da virada. Pés na areia e mergulho no mar, aquele primeiro do ano, só depois de
uma virada da maré.
Enquanto
isso, cedo o espaço aos visitantes que lotam um dos mais lindos cartões postais
brasileiros (para ser modesta), me deliciando com o som feito por um músico de
rua e seu violão amplificado.
Pode ser
que, como acontece a cada verão, o novo ano venha cheio de esperanças e desejos
que, nem sempre, se realizam. Pode ser. Mas agora, nesse momento, como grande
parte dos brasileiros, mentalizo as melhores vibrações.
Desejo a
todas as pessoas de bem e, claro que a você, leitor que me acompanha, apenas
que nossos sentidos se abram para receber as energias positivas que emanam dessa
incrível passagem de ciclo, promessa de novos desafios e realizações.
*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Texto da série “Arpoador” do SEM
FIM... delcueto.wordpress.com