Mostre-me um exemplo TRIBUNA DE URUGUAIANA: 10/17/23

17 de out. de 2023

Fadiga cognitiva - de Valéria del Cueto


Fadiga cognitiva

Texto e foto de Valéria del Cueto

Querida cronista enclausurada do outro lado do túnel. Pela fresta do raio de luar que atravessa a janela de sua cela (ainda) trago notícias do lado de cá. O que deveria ser o escape, pra variar, está em guerra. Mais uma. Eu, que não sou marciano, mas também não sou humano, é quem falo aqui da Terra. Testemunho in lo(u)co o desvario que domina o planeta de onde, sinceramente, gostaria de pirulitar.

Tento dourar a pílula, mas não tem como. Se a coisa já andava ruim por aqui, periclitando ensandecida entre a intolerância costumeira generalizada e o fundamentalismo fanático opinativo, de uma semana e pouco para cá degringolou de vez.

Tá bom, não vou fazer suspense para coloca-la a par dos novos capítulos da saga humana que, parece, estreia uma nova temporada. Pensando bem, talvez, nem tanto assim...

Acontece que, não satisfeitos com os sérios eventos climáticos que pipocam por toda a superfície do planeta (fruto, entre outros fatores, do manejo inadequado de suas reservas naturais, colocadas à disposição da senha dos “ousados”, ávidos e insaciáveis seres humanos), tão pouco preocupados com o excesso de conflitos existentes em vários continentes que afetam a vida das comunidades, especialmente as mais vulneráveis, os habitantes da terra, no caso a prometida, conseguiram extrapolar, mais uma vez, sua capacidade de testar os extremos civilizatórios.

Alguns analistas já previam que países africanos, por exemplo, estavam em pé de guerra. E que estas (várias) arrastariam o mundo que deixou pra trás a pandemia de covid-19 e já se engalfinhava em batalhas sangrentas entre a Rússia e a Ucrânia.

Está acompanhando o raciocínio de Pluct, Plact, seu correspondente extraterreste, cara cronista? Pois é, assim caminhava a (des)humanidade até o sábado, 7 de outubro, do septuagésimo quinto ano de criação do Estado de Israel.

Foi aí que o Hamas driblou o Domo de Ferro, até então o invulnerável sistema de defesa aéreo israelense. Com um trator velho rompeu um trecho da cerca que separa da Faixa de Gaza e, invadindo uma desavisada megapotência no Oriente Médio barbarizou geral, tocando horror em Israel. Estou sendo genérico, se é que isso é possível. Entre centenas de mortos e reféns recolhidos ao território palestino, o que faz o líder atacado que dormiu no ponto e não viu uma marola sequer de preparação das hordas do Hamas e do Hezbollah em seus movimentos coordenados?

Retalia com violência proporcional e, dobrando a aposta, decreta um barata voa para todos os moradores do norte de Gaza. A ordem é para rumarem para o sul, em direção a fronteira egípcia que, ressalte-se, está fechada para refugiados. Inclusive, até outro dia, para cidadãos de outros países, como o Brasil, que estavam na Palestina.

Deu pra ter uma noção geográfica desse mapa da mina explosivo? Então, querida mentora, embaralha tudo com uma overdose de notícias falsas pra tocar fogo no parquinho da geopolítica mundial.

Só penso no tempo em que, graças as suas indicações, mergulhei na história das civilizações(?) tentando entender o que move a ganância humana. Sem esses indicadores e parâmetros não teria argumentos para tentar explicar essa capacidade inerente de autodestruição civilizatória dos habitantes do planeta a meus superiores interplanetários. Maias, astecas, egípcios, gregos, romanos...

Pra que metermos a mão nessa cumbuca? (Imagina euzinho explicando o significado da expressão pra eles.) É só deixar nas mãos dos representantes dos deuses em conflito que a humanidade autofagicamente se depura. Mesmo sabendo que seus atos de barbárie levarão a todos diretamente ao inferno das atrocidades, o que mais se escuta dos líderes mundiais é um brado retumbante e covarde: “eu autorizo”.

As consequências são imprevisíveis porque não há como imaginar os horrores que serão entregues à humanidade ao vivo e a cores, especialmente pelas redes sociais.

Sinto muito, querida amiga, se não tenho nenhuma dose de otimismo e esperança a lhe oferecer aqui de fora.

Meu conselho? Para evitar esse cansaço de pensar que me habita, fique onde está. Foque sua mente na monotonia das paredes nuas da sua cela.

Daí, desloque-se em sua fértil imaginação pelo maravilhoso mundo que conheceu e fez questão de me apresentar antes que essa fadiga cognitiva humana se apoderasse por osmose do seu aventureiro amigo intergaláctico.

E lembre-se: o que é seu está guardado em outra esfera sideral!  

*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Crônica da série “Fábulas Fabulosas” do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

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